Por Gaudêncio Torquato
Kim Jong-un, ditador da Coréia do Norte, pega seu trem blindado e luxuoso e corre para encontrar Vladimir Putin, na Sibéria. O ditador quer aproveitar o tenso momento mundial para fazer um acordo de cooperação com a Rússia, pelo qual receberá tecnologia para melhorar a performance de seus misseis balísticos e, em troca, cederá armas, algumas até ultrapassadas, ao ditador russo.
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Luiz Inácio, presidente do Brasil, diz que Putin, caso venha ao nosso país para participar da cúpula dos Brics, em 2024, não será preso. Alertado pela assessoria, corrigiu-se com a declaração de que tal decisão caberá à Justiça. E o ministro da Justiça, Flávio Dino, alertou que o Brasil poderá rever sua participação no TPI (Tribunal Penal Internacional), que Lula garantiu não conhecer, mesmo tendo nomeado, em 2003, a juíza Sylvia Steiner para compor o quadro daquela Corte.
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O presidente Câmara dos Representantes Estados Unidos, Kevin McCarthy, anunciou, na última terça-feira, que instruiu os comitês de Justiça, Supervisão e Tributário para abrir um processo de impeachment contra o presidente Joe Biden por ter cometido “abuso de poder, corrupção”. Medida inconsequente, ante o fato de que os democratas dominam o Senado, onde uma decisão desse porte não passaria.
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Voltemos ao Brasil para constatar o ministro José Antônio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, anulando todas as provas obtidas dos sistemas Drousys e My Web Day B, utilizadas a partir do acordo de leniência celebrado pela Odebrecht, no âmbito da Operação Lava Jato. E mais: disse que a prisão de Lula foi o maior erro da Justiça no Brasil em todos os tempos. Um turbilhão de dúvidas. Perplexidade. Se não existem provas, o dinheiro resgatado das propinas, mais de 6 bilhões, será devolvido às empresas que confessaram o ilícito?
Questões que emergem: Toffoli pensou nas consequências de sua decisão? O que pretende Kim Jon-un com a indisfarçável intenção de aperfeiçoar seu arsenal atômico? Disparar mísseis na direção de Washington e Nova Iorque? Ou ser protagonista da Guerra-Fria 2, com uma aliança entre Rússia, China e Coréia do Norte?
O nosso Supremo começa a julgar os delinquentes do evento 8/01, que depredaram as sedes dos Três Poderes, e, Brasília. Começam a ser condenados. Por que aquela turba feroz agiu com tanta insanidade?
Afinal, “donos do poder” e “multidões enfurecidas” deixam de usar a razão para agir sob o império exclusivo da emoção? Costumo pinçar o pensamento do professor Samuel Huntington, de Harvard, quando tenta desenhar a paisagem e descrever o paradigma do caos: “quebra da lei e da ordem, Estados fracassados e anarquia crescente, onda global de criminalidade, máfias transnacionais e cartéis de drogas, declínio na confiança e na solidariedade social, violência étnica, religiosa e civilizacional e a lei do revólver.”
Que síndrome corrói a Humanidade nesses tempos de barbárie? Seria a síndrome do touro, o animal que pensa com o coração e arremete com a cabeça? No caso dos agressores do 8/01, não há dúvidas. O touro conduziu a turba na depredação. No caso de Toffoli, a emoção também teria influenciado sua decisão. Agiu assim para resgatar a antiga amizade com o presidente Lula. É a leitura da mídia.
No caso do impeachment de Biden, vê-se uma querela histórica entre republicanos e democratas. Em momentos de polarização, como os que vivemos, a síndrome do touro costuma baixar sobre os grupos beligerantes. Que, aliás, tem entre seus líderes a figura estrambótica de Donald Trump. E no caso de Kim e Putin, é sabida a intenção armamentista de ambos. Sempre de prontidão para atacar a presa.
O fato é que o planeta passa por instantes de grandes sustos. De um lado, alinham-se as presepadas de certos figurantes; de outro, as intempéries que castigam territórios, fenômenos como terremotos, ciclones e chuvas torrenciais. O terremoto no Marrocos, as inundações na Líbia, os ciclones, no hemisfério norte e, e agora no hemisfério sul, devastando o Rio Grande do Sul, deixam marcas profundas de medo e desalento.
A temperatura se eleva, esquentando as águas oceânicas e trazendo ondas de calor. Em cidades norte-americanas, a temperatura alcançou 50º. C. Daqui a 50 anos, o planeta deverá atingir o pico de 10,4 bilhões de pessoas, vivendo sob um clima que poderá subir até 3º C. Os países de baixa renda sofrerão mais.
Além do medo, as incertezas pairam sobre a Humanidade. As pandemias matam milhões de pessoas. Entre a vida e a morte, a distância é menor que uma vírgula. Os paradoxos da modernidade se escancaram: nunca se gastou tanto em segurança pública e privada, mas os cidadãos nunca se sentiram tão inseguros; investem-se bilhões e bilhões em biotecnologia e nas mais diversas áreas da medicina para prolongar o tempo de existência do ser humano, mas o percurso da vida é um fio tênue.
E o que fazem os governos? Deixo a resposta com os leitores.
Há 226 anos, o segundo presidente dos Estados Unidos, John Adams, fazendo uma reflexão sobre os governos, dizia: “todas as ciências progrediram, menos a de governar, que não avançou, sendo praticada apenas um pouco melhor que há quatro mil anos”. O conceito se amolda a alguns governantes, assemelhados a touros, que pensam com o coração e arremetem com a cabeça.
Gaudêncio Torquato é escritor, jornalista, professor titular da USP e consultor político