Escritor Moura Lima, em visita ao escritor e colega da Academia de Letras do Estado do Tocantins, Messias Tavares, autor das notáveis obras: A Viagem do Tempo e Vozes do Tempo.
por Redação
Messias Tavares é expoente da Cultura de Goiás e Tocantins, bisneto do fundador e desbravador de Pedro Afonso-To, Caetano Tavares da Silva, segundo ele,- “somente agora, com a publicação de SERRA DOS PILÕES, DO ESCRITOR Moura Lima, o seu nome emerge do esquecimento depois de mais de um século”. Vejamos o registro de Moura Lima, extraído de Serra dos Pilões: –
“-Eu conto essas histórias é pra ocês contar aos seus filhos, e esses aos netos, bisnetos, e fazer justiça aos homens que desbravaram esse sertão bruto.
Escritor Moura Lima, em visita ao escritor e colega da Academia de Letras do Estado do Tocantins, Messias Tavares.
O maior deles foi o velho Caetano Tavares da Silva, que veio de Pernambuco e deu com os costados na fazenda Testa Branca, situada entre Santo Antonio de Balsas e Riachão, no sertão maranhense. Ali ficou viúvo ainda jovem, e tendo no sangue o azougue de desbravador, rumou pra região, hoje chamada de Pedro Afonso. Moço vigoroso, que acalentava na alma o desejo de devastar imensidões, pisar campinas onde ninguém antes calcara o pé, atravessar rios desconhecidos, furar matarias que homem algum até então havia varado. E nas margens do ribeirão Boa Esperança instalou, com muito suor e trabalho, a sua fazenda, que chamou de São Roque. Era um homem corajoso, que não se detinha diante de qualquer desafio.
E o meu pai conta que o viu atravessar a nado o rio do Sono, muitas e muitas vezes, com o arreio na cabeça, nadando de pé, como se tivesse nos pés nadadeiras! E não tinha essa estória de me dá-cá-aquela-palha, não; era a qualquer hora do dia e da noite, e nas enchentes. Lá ia o homem nadando como um boto!
De certa feita, perdeu-se nos sertões da margem direita do rio do Sono, saindo na beira de um de seus afluentes, a que batizou de rio Perdida.
-Antão é o descobridor do rio Perdida, inquiriu Tião Rapadura.
-Não só é o descobridor, como também é o homem que o batizou de rio Perdida, que aí está nos mapas.
-Xi! O homem era corajudo igual boi baguá!
-Não se espante, Tião, e veja as façanhas do homem:
-Numa manhã de céu claro, ele saiu pelo sertão bruto, da margem direita do rio do Sono, bem nos fundões, à procura de burros fujões, e deparou com duas cunhãzinhas xerentes, correndo pela campina. Não pestanejou. Chegou os rosetões das chilenas no vazio do pingo, alcançando-as, e num safanão, pegou-as e, a toda brida, levou-as para casa. Uma delas ficou de calundu, embezerrada, não aceitou comida e foi definhando até morrer. A outra eu, quando menino, a conheci na companhia da velha Jesuína, e se chamava Taína.
Apesar de ser um sertanejão rude desses socobós, o homem tinha visão do futuro e pensou, lá nele, na sua fé, pois era temente a Deus: o arraial de São João está no começo; é bom trazer um padre pra ajudar a civilizar essas brabezas de gerais. Isso foi no ano de 1846, se não me falha a cachola. Desde esse dia, o homem não dormiu mais direito, pois a idéia ferroteava-lhe a alma como um esporão de arraia. E no quebrar das barras de um dia de setembro, que se perde na poeira do tempo, sem aviso jogou o lombilho na cacunda do matungo e rompeu estirão, vencendo as leguonas, de rota batida pra capital da província. Ia na sua fé, com o matungo batendo orelhas, por aqueles caminhos desconhecidos, buscar um padre pra ajudar a amansar essa região. Foi o primeiro homem saído dessas brenhas a realizar tão grande proeza. Estradas não existiam, a não ser a rota das águas. Mas o velho Caetano Tavares, movido por sua fé e bravura, rompeu estirão, atravessando rios, brejos, matarias, transmontou morraria, cruzou os Pirineus e, costeando a Serra-Dourada numa fulgurante manhã de céu azul, com uma solama arregalada, bateu dentro de Vila Boa.
As autoridades, lá de cima, ficaram com os queixos caídos, com tamanha audácia e coragem de Caetano Tavares da Silva.
O padre Rafael de Taggia, comovido pela fé e bondade de Caetano Tavares, resolveu acompanhá-lo na volta, para ajudá-lo no desbravamento dessa região.
-Uê! Uê! Exclama, surpreso, Tião, pois antão não foi o homem que amansou as onças e a bugrada da região?!
-É verdade, Tião, e sabe lá Deus com quanto sofrimento!
-Antão, não tenho dúvida, é ele o verdadeiro fundador do arraial de São João!
-É o que sempre digo. Agora, é claro, que sou um velho ignorantão, sem modos. Mas sei, na minha saberência, que os padres, por terem muita leitura, trouxeram o progresso e organizaram a fundação de Pedro Afonso.
Januário, levantando-se do chão, bate no peito, de forma enérgica, e reitera empolgado:
-Justiça seja feita! Caetano Tavares da Silva é o verdadeiro desbravador da região de Pedro Afonso!”