De maneira cronológica, Giovanni Salera Júnior, especialista em Direito Ambiental, Mestre em Ciências do Ambiente e Analista Ambiental do Governo Federal, lotado no IBAMA, descreve a luta pela Transbananal desde a década de 70, “quando gerou enorme repercussão negativa” ao o período atual da história. “Vale lembrar que existem dezenas de obras bem executadas em vários estados (inclusive no Tocantins!) que podem servir de modelo para a Rodovia Transbananal”.
por Giovanni Salera Júnior
A Rodovia Transbananal corresponde ao trecho de aproximadamente 90 km da Rodovia Federal BR-242 que corta a Ilha do Bananal (situada na porção oeste do Tocantins, divisa com o Mato Grosso), vindo daí seu nome.
A BR-242 é uma das maiores rodovias transversais do Brasil, com extensão total de 2.353 km. Ela inicia no município de Maragogipe (BA), passa pelo Tocantins e finaliza na cidade de Sorriso (MT). Vários trechos da BR-242 não estão pavimentados, incluído a parte que atravessa a Ilha do Bananal.
O Governo Militar na década de 1970 implantou diversos projetos grandiosos para impulsionar o desenvolvimento nacional. O norte de Goiás (hoje Tocantins), o sul do Pará e o estado do Mato Grosso foram definitivamente incorporados a esse ciclo de expansão capitalista.
Foi nesse contexto que, em 1979, os militares implantaram nas proximidades da Ilha do Bananal o Projeto de Irrigação Rio Formoso, sendo considerado o pioneiro e o maior projeto de agricultura irrigada em terras contínuas da América Latina. Para escoar essa gigantesca produção agrícola eles pavimentaram um trecho de aproximadamente 45 km interligando o município de Formoso do Araguaia com a Rodovia Federal BR-153.
Foi nesse ciclo grandioso de desenvolvimento que os militares iniciaram os preparativos para pavimentação do trecho da BR-242 que corta a Ilha do Bananal, ligando Formoso do Araguaia (TO) a São Félix do Araguaia (MT). A obra foi autorizada pelo General João Baptista de Oliveira Figueiredo, então Presidente da República.
Contudo, essa primeira tentativa de asfaltar a Rodovia Transbananal gerou enorme repercussão negativa. Naquela época, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) era quem exercia o trabalho de proteção ambiental em âmbito federal e era o responsável pela gestão do Parque Nacional do Araguaia, localizado no interior da Ilha do Bananal.
“Eles têm acesso aos bens e serviços da cidade, muitos têm boa escolaridade e estão conectados pelas redes sociais com o mundo todo”, Giovanni Salera.
Em dezembro de 1982, a Diretora de Departamento de Parques Nacionais, Engenheira Maria Tereza Jorge Pádua, pediu demissão do IBDF em protesto à construção dessa rodovia.
Ela não estava sozinha, pois dezenas de artistas, jornalistas e inúmeras lideranças, como o indigenista Sidney Possuelo da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o Bispo Dom Pedro Casaldáliga da Prelazia de São Félix do Araguaia, além de parlamentares integrantes do Movimento de Defesa da Amazônia (MDA), membros do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Associação Nacional de Apoio ao Índio (ANAI), manifestaram-se contrários a essa proposta.
Todos temiam que a pavimentação prejudicasse as comunidades indígenas e o meio ambiente.
Naquele tempo, a população indígena era pequena, cerca de 1700 índios, distribuídos em 5 aldeias. Tinham pouca comunicação com as cidades e os fiscais ambientais e técnicos da FUNAI não possuíam os recursos tecnológicos de hoje.
“Certamente que a realidade atual é bem diferente! A legislação e a consciência ambiental se fortaleceram, a economia da região aumentou exponencialmente e os interesses em relação a essa obra se convergiram”, Giovanni Salera. Foto: Aldeia Javaé Boto Velho, Ilha do Bananal.
De lá pra cá muita coisa mudou. A população indígena cresceu bastante. Atualmente, são cerca de 4500 índios, distribuídos em aproximadamente 35 aldeias. Eles têm acesso aos bens e serviços da cidade, muitos têm boa escolaridade e estão conectados pelas redes sociais com o mundo todo. O Ministério Público Federal (MPF) está bem atuante e atento na defesa dos direitos dos povos indígenas.
Se antes o IBDF atuava praticamente sozinho, agora a preservação ambiental conta com uma força maior de varias entidades: IBAMA, Instituto Chico Mendes, Batalhão da Polícia Ambiental, NATURATINS, Secretarias Municipais de Meio Ambiente etc.
Certamente que a realidade atual é bem diferente! A legislação e a consciência ambiental se fortaleceram, a economia da região aumentou exponencialmente e os interesses em relação a essa obra se convergiram.
O engenheiro José Rubens Mazzaro é o protagonista na efetivação dessa proposta que está completando 4 décadas de história. Ele é o líder da Comissão Pró Rodovia Estadual TO-500 (que é outro nome dado a Rodovia Transbananal), e tem ido à Brasília e percorrido cidades do Tocantins e Mato Grosso para debater e angariar apoio político e da iniciativa privada.
Diferente dos anos 70, hoje as instituições governamentais e as empreiteiras tem enorme clareza nos critérios necessários para execução de uma obra desse porte. Vale lembrar que existem dezenas de obras bem executadas em vários estados (inclusive no Tocantins!) que podem servir de modelo para a Rodovia Transbananal.
A proposta de colocar pedágios para gerar recursos para serem aplicados no desenvolvimento social tem agradado significativa parcela das comunidades indígenas, da FUNAI e outros órgãos correlatos.
“A proposta de colocar pedágios para gerar recursos para serem aplicados no desenvolvimento social tem agradado significativa parcela das comunidades indígenas, da FUNAI e outros órgãos correlatos”, Giovanni Salera.
No próximo dia 18 de outubro, a cidade de Gurupi (TO) será palco de uma Audiência Pública que contará com a presença de governadores dos dois estados, Mauro Carlesse, do Tocantins, e Mauro Mendes, do Mato Grosso. Além do Ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, da senadora Kátia Abreu, dos presidentes do IBAMA, da FUNAI, representantes do Ministério Público, lideranças indígenas Karajá e Javaé, entre outros.
Essa Audiência Pública promete ser bem acalorada e produtiva, pois tratará de um tema polêmico e que gera muitas expectativas há 40 anos!
* Giovanni Salera Júnio é graduado em Matemática e Biologia, Especialista em Direito Ambiental e Mestre em Ciências do Ambiente. Atualmente é Analista Ambiental do Governo Federal. Tem experiência na elaboração e participação em projetos de diferentes áreas: educação, assistência social, cultura, meio ambiente etc. Já publicou artigos científicos e dezenas de textos em jornais, revistas, sites e blogs.