O deputado federal Cesar Hallum (PRB-TO) não pertence, como ele mesmo diz, ao “alto clero” do Congresso. Seu Estado, o Tocantins, tem apenas oito representantes na Câmara. Seu partido, o PRB, é representado na equipe ministerial com a pasta da Pesca.
Pertence, portanto, àquela massa de deputados da base aliada da presidente Dilma Rousseff que costuma apoiar sem barulho as propostas enviadas pelo governo federal quase sempre sem ser muito notado. Na sexta-feira, véspera do feriadão do Carnaval, o plenário esvaziadíssimo da Casa foi palco de um dos discursos mais sinceros e contundentes em termos de queixas ao tratamento dado por Dilma e seus ministros aos aliados.
“Todos estamos fazendo um esforço muito grande para poder ajudar a Presidente Dilma para que o Brasil possa crescer. Mas eu estou observando que lá pela SRI (Secretaria de Relações Institucionais) e por outros ministérios fazem tudo para não deixar apoiar a Presidente Dilma, nos jogam fora. Fazem da gente gato e sapato”, acusou.
Hallum resolveu fazer barulho porque se disse, literalmente, cansado de “ser tratado como moleque” pelo governo. Num jogo sem hipocrisia, deputados apóiam o governo e, em troca, querem a liberação de recursos para suas emendas parlamentares. Com isso, fazem suas políticas paroquiais e aumentam as chances de serem reeleitos. É o movimento de sempre, de toma lá, dá cá, que tanto desgasta a imagem dos políticos brasileiros. Mas é um sistema que o atual governo, assim como os anteriores, considerou legítimo fazer.
Os parlamentares reclamam, porém, que o governo parou de fazer a sua parte. Ou faz apenas depois de enorme insistência do parlamentar. Por conta disso, surgiu o chamado “blocão parlamentar”, que se proclama independente e que, em tese, se dispõe a votar contra projetos de interesse do governo. Pelo tom do deputado Hallum, a paciência da base acabou.
“Vou dar aqui alguns exemplos: eu nunca pedi nada ao Governo que não fosse dentro daquilo estabelecido nas regras. Então, se a cota que cada Deputado tinha para empenho de suas emendas era aquela, eu sempre pedi dentro da cota. Então, a cota é x, aí a SRI manda lá para o ministério a cota. Chega lá, está aqui a minha emenda, está a proposta no SICONV, vamos empenhar”, diz Hallum.
E o parlamentar revela sua frustração por nada se concretizar. “Aí eu fico igual bobo. Vou lá e: não, empenha amanhã, depois de amanhã, não sei o que lá. Não, a SRI não mandou o limite. Chego lá e: não, está aqui. Eu mandei o limite. Aí eu chego lá: não, o limite chegou. Então, vamos empenhar.
Vou dar um exemplo simples do Ministério da Agricultura. Coloquei 500 mil reais numa emenda para estradas vicinais no Município de Aragominas, no Tocantins. Quando chegou lá pelo dia 15 de dezembro, me chamaram: Olha, o município vai perder a emenda. Vamos trocar o município. Eu corri e atendi o município de Carrasco Bonito. Coloquei a emenda de 500 mil para Carrasco Bonito. Foi feita a proposta, foi apresentado o projeto. E diziam: está empenhado, empenhado e empenhado. Então, tudo bem. Quando chegou no dia 31 de dezembro, não empenharam. Mas não estava o limite aqui? É. Mas o dinheiro sumiu. Eu não sei onde ele está. Vai à SRI. Não, já mandei o limite para lá. Chego lá: Não, aqui não chegou. Eu volto para lá, igual besta. Tratam a gente como moleque. Tudo bem. Aí a SRI fala: não, o limite está lá”, reclama, irritado.
Sem meias palavras, Hallum continuou sua sincera narrativa pela busca da verba perdida e o jogo de empurra ao qual disse ter sido submetido.
“Ontem, estive no Ministério da Agricultura. Vamos abrir o jogo, porque eu disse à Ministra Ideli em um dia aqui, na reunião dos partidos da base: ministra, se a senhora disse que mandou o limite para lá e o ministro pegou o dinheiro e deu para quem ele quis lá do Estado dele, beneficiou parlamentar da bancada dele, isso não é certo. Isso é, no mínimo, desonesto ou então é incompetência, e nem desonestidade e nem incompetência servem para administrar. Então, se vocês acham que o ministro fez errado, demitam o ministro. Mas, se o Governo não demite o ministro, é porque está concordando com isso. Não, mas isso é compromisso irremovível, não sei o que mais e tal e tal”, conta Hallum, mostrando que o governo tinha renovado sua promessa de liberar o recurso.
“Cheguei ao Ministério da Agricultura ontem e vi. Chego lá e está aqui: no dia 13 de dezembro, o limite estava lá, mas, no dia 13 de dezembro, a SRI tomou o limite de volta. E ficam me fazendo de besta em ir lá. Mas não era o limite? Não era a cota estabelecida? Não deram para todos os outros aquele mesmo valor?
Pois bem, hoje o Prefeito de Carrasco Bonito acha que eu estou mentindo para ele, que não coloquei a emenda para ele. E nós parlamentares estamos ficando mal na nossa base por conta dessas coisas aqui. Então, eu digo assim: nós somos da base do governo, queremos conviver bem para ajudar o governo, mas parece que tem gente dentro do governo que quer destruir essa nossa relação”, afirmou.
E, repetindo o que outros colegas já vêm insinuando, avisou que pode até trocar de lado na campanha presidencial:
“Eles estão dizendo assim: vocês estão querendo, mas nós não queremos vocês. Vão embora, vão para o outro lado. Eu estou entendendo assim”, avisa.
No discurso, Hallum também disse não temer retaliações.
“Vejo aqui a turma falar: César, você vai falar isso e você vai ficar marcado, porque eles vão te perseguir de agora para frente. Mais? Eu já não recebo nada! Olha, não tem perseguição. Vocês precisam entender que eu estou querendo contribuir para que todos sejam tratados de forma igual.
Muita gente critica, diz que é barganha o governo pagar as emendas de um parlamentar. Não é barganha, não! O povo brasileiro tem que entender que os pequenos Municípios deste País só recebem alguma obra do Governo Federal se for através de uma emenda de um Parlamentar que briga para levar uma feira coberta, para levar uma quadra de esportes, um campinho de futebol, uma ponte na zona rural. É esse o nosso trabalho! Agora, o que justifica o meu Estado me mandar para cá, eu ser Deputado Federal durante 4 anos e não retribuir em nada lá”, critica
“Fica aqui o registro da minha indignação à SRI, para que ela pare com essa brincadeira de fazer a gente ficar indo de um lado para o outro, desgastando uma relação que tem tudo para ser boa. Ou então abra o jogo logo: Estamos dispensando vocês. Procurem os seus caminhos. Eu procuro! A gente também não é filho sem pai, não. Tem quem quer! Agora, eu quero ter uma relação boa com o Governo, e estou vendo os Ministros do Governo Dilma querendo destruir a nossa relação. A gente vota o orçamento impositivo, e eles, da forma mais descarada, no maior desrespeito, vão lá, cortam 25% das emendas e não dão nem satisfação. É como se nós não existíssemos. Esta Casa não pode viver de cócoras para o Poder Executivo, porque aí é o fim do Parlamento brasileiro”, encerrou.