“A história nos ensina, entretanto, que a experiência não é fundamental, mesmo para os cargos do executivo. Abraão Lincoln, tido por muitos como o melhor presidente dos Estados Unidos, nunca havia exercido qualquer cargo no executivo e já estava afastado da representação pública havia mais de dez anos”. Mario Fortes Braga.
por Mario Fortes Braga
Queremos apresentar um questionamento sobre as vantagens e desvantagens que nós brasileiros teríamos se, a cada mandato, houvesse uma renovação total dos representantes do povo junto ao poder Legislativo e Executivo.
Esta renovação não aconteceria de forma voluntária como alguns a defendem. Seria compulsória, provocada por uma emenda constitucional que determinasse inelegibilidade automática para todos aqueles que exercem cargos eletivos.
Assim, por exemplo, um deputado estadual, ao final de seu mandato, não poderia mais concorrer a este cargo, nem a deputado federal nem a senador, nem a nada. Estaria inelegível constitucionalmente.
Se a política deixasse de ser profissão seria bom ou ruim para o Brasil?
Certamente qualquer profissional da representação pública seria frontalmente contra essa idéia.
Aqueles, no entanto, que não são políticos podem eventualmente concluir que a extinção desta profissão traria mais benefícios para a sociedade do que eventuais prejuízos ou inconvenientes.
O que se faz hoje em nome dessa política nos ajuda a pensar que a democracia faliu e nos incentiva a procurar uma solução que leve em conta os vícios adquiridos pelo sistema democrático.
Talvez o principal desses vícios seja a prioridade que nossos representantes dão para suas próprias carreiras em detrimento de sua função original como representante do povo.
Precisamos achar uma maneira de resgatar a força do processo democrático e talvez uma alternativa seja a adoção de uma democracia sem políticos de carreira.
Esta mudança certamente seria motivo de críticas.
Suas vantagens e desvantagens devem ser amplamente discutidas.
Seriam Vantagens:
- Purificação do processo democrático.
- Ampliação do horizonte político com a participação de um número maior de pessoas.
- Intensificação das atividades de cada representante do povo pois não haveria mais a preocupação em trabalhar pela sua reeleição.
- Extinção da carreira de político o que contribuiria na redução do custo de uma eleição, diminuindo a influência do dinheiro no processo democrático.
- Fim da aposentaria como representante do povo.
- Maior sinceridade na aprovação ou reprovação de projetos.
Seriam pontos de discussões:
- A proposta é utópica.
- Faltaria experiência ao político de primeiro mandato.
- A corrupção seria maior.
- Um político que não precise se reeleger não teria motivos para se preocupar com o povo.
- Todos devem ter direito a se candidatar.
- De nada adianta impedir que um político se reeleja, pois este colocaria em seu lugar alguém de sua confiança.
- Utopia
A proposta do fim da reeleição é boa, porém utópica.
Jamais qualquer parlamentar votaria uma emenda constitucional que decretasse o fim de sua carreira pessoal.
Quem vota as emendas constitucionais são realmente os membros do Congresso Nacional mas precisamos lembrar que somos nós que votamos neles.
No Brasil, mais de cem milhões de eleitores estão aptos a irem às urnas para escolherem somente 513 deputados federais.
Seria incorreto classificar como utópica uma solução que favoreça a todos os brasileiros somente por levar em conta o bem estar dos atuais deputados federais e senadores.
Um dia estes eleitores vão se cansar do comportamento cínico adotado por grande parte de nossos representantes e, com certeza, vão procurar uma maneira de purificar o processo eleitoral. Não é utopia pensar nisso agora.
- Experiência
O político de primeiro mandato não teria a experiência necessária ao exercício de suas funções.
As pessoas que fazem esta afirmação estão se referindo aos cargos do executivo pois não há nada na rotina do legislativo que não possa ser executado por qualquer pessoa bem intencionada.
Nos cargos do poder executivo o argumento da experiência seria aparentemente correto.
A história nos ensina, entretanto, que a experiência não é fundamental, mesmo para os cargos do executivo. Abraão Lincoln, tido por muitos como o melhor presidente dos Estados Unidos, nunca havia exercido qualquer cargo no executivo e já estava afastado da representação pública havia mais de dez anos.
Seu governo foi um sucesso. A experiência naquele cargo específico se mostrou menos importante do que sua capacidade pessoal de gerir a nação.
No Brasil temos inúmeros exemplos de prefeitos, governadores e mesmo presidentes da república que fizeram um primeiro mandato brilhante e um segundo mandato sofrível. Se a experiência fosse tão importante isso não ocorreria nunca.
- Corrupção
O novo parlamentar será um corrupto faminto, pois terá somente um mandato para satisfazer todo seu apetite.
Ninguém seria tolo suficiente para afirmar que a eliminação dos políticos profissionais possa resultar em uma representação pública livre de todo o tipo de corrupção. A natureza humana não nos sugere isso. Pode ocorrer que o parlamentar de primeiro mandato também resolva optar pelos desvios de ética. Porém, o político de primeiro mandato possui menos experiência em atos ilícitos ligados à representação pública. Não possui também antigos aliados. Estará, portanto mais vulnerável e com maiores chances de ser desmascarado.
– O político de primeiro mandato terá a provável fiscalização de outros políticos de primeiro mandato. Seus pares não necessariamente teriam motivos para estabelecer qualquer espírito de corporativismo.
– O político de primeiro mandato saberá que não poderá contar com sua imunidade parlamentar.
- Demagogia
O esforço pela reeleição é um mal necessário, pois obriga cada político a nortear suas ações de maneira a agradar seus eleitores.
Esta maravilha não tem acontecido hoje. Os políticos descobriram a força da demagogia. Um exemplo é o inchaço da administração pública. Ninguém quer demitir, só contratar. Isso agrada a população e isso obviamente dá voto.
Mas, podem dizer alguns, se agrada a população então é porque se trata de uma medida boa. Maquiavel já nos dava a resposta a esse engano. A intensidade das reações é diferente. O funcionário público demitido guardará dentro de si um sentimento negativo muito mais intenso que todas aquelas pessoas beneficiadas.
O político de carreira também descobriu que precisa de promoção pessoal. O custo das campanhas promocionais deve fazer parte do custo total de todas as obras. Medidas demagógicas seguidas de campanhas promocionais criam a imagem do político atuante e querido pelos eleitores.
Seria melhor se tivéssemos representantes mais sinceros em seus atos que contratassem ou demitissem pessoas somente quando julgassem necessário à administração pública.
- Paradoxo da Liberdade
Impedir a reeleição é cercear a liberdade.
Qualquer cidadão tem o direito de se fazer candidato.
Na vida real, quando um governador decide pela sua reeleição está, ao mesmo tempo, dificultando a candidatura de todos seus colegas de partido.
Este governador quando candidato, torna-se desde o primeiro dia um competidor de peso. Tem a seu favor a estrutura do estado o que, normalmente, inviabiliza e constrange a candidatura de um cidadão comum.
Para enfrentar um governador em eleição direta (independentemente da qualidade de seu mandato), um postulante terá invariavelmente uma batalha árdua. Muitos desistem antes de começar. Este governador ao exercer a sua liberdade e o seu direito à reeleição, está na verdade tirando a liberdade de muitos outros. O mesmo ocorre para deputados, senadores, vereadores, prefeitos e presidentes. A reeleição representa um limitador das liberdades individuais.
- Transferência de Prestígio
Um político inelegível indicará sua esposa ou filho para representá-lo.
Verdade. Alguns políticos irão escolher alguém que os represente possibilitando assim a manutenção de seu vínculo com o poder. Ocorre, no entanto que, somente alguns terão força suficiente para projetar em outro nome o seu prestígio pessoal.
Além disso, este novo candidato terá, um dia, que encontrar também seu substituto se o mentor original continuar inelegível.
A inelegibilidade traz um obstáculo muito grande para todos aqueles que querem fazer da política a sua profissão.
* Mario Fortes Braga é autor do livro ” Os políticos profissionais mataram a democracia”.