Em entrevista ao Portal Atitude, o pioneiro Jonatas Vieira Rocha, conhecido como Jonas, falta sobre 56 anos como sapateiro, mudanças políticas local e nacional, evolução da educação, saúde, energia elétrica e comunicação. “Meu pai morreu em Porto Franco (MA) no ano de 1963, na época que o Jonair Rocha nasceu e eu fiquei sabendo cinco dias depois por meio de um telegrama que passaram par ao meu cunhado que chegou em Porto Nacional e depois chegou a Gurupi”, ao fazer um passeio na história de Gurupi.
por Wesley Silas
No dia 26 de fevereiro de 1961, o pioneiro Jonatas Vieira Rocha, conhecido como Jonas, chegou a Gurupi para trazer de Pedro Afonso a mudança de uma professora Convenção Batista Brasileira, amiga de uma de suas irmãs, foi atraído a permanecer após ser convidado para fazer um trabalho por um período curto, conhecido hoje como freelance, em uma sapataria.
“O sapateiro Oriel que era de Balsas (MA) esteve comigo em Pedro Afonso quando me chamou para vir a Gurupi e eu não quis, mas acabei ficando aqui depois que vim deixar a mudança da professora. A minha intenção era ir para Goiânia (GO) ou Brasília (DF) porque eu queria estudar, pois naquele tempo eu só tinha o primário”, relata.
Sr. Jonas é na natural de Floriano (PI), morou em Pedro Afonso e aos 23 anos de idade foi convidado para realizar um serviço temporário na sapataria de Oriel em Gurupi, localizada na época na Avenida Goiás entre as Ruas 03 e 04, quando a cidade fazia parte do antigo norte goiano.
“Fui trabalhar com ele e tinha quatro sapateiros. Minha intenção era ficar apenas uma semana e esse negócio não terminou e até hoje estou em Gurupi. Depois o Oriel quebrou o comércio, foi embora e eu retornei a Pedro Afonso pequei umas máquinas lá, retornei e gostei de Gurupi”, disse.
O pioneiro lembra que quando ele chegou a Gurupi, a cidade resumia na Avenida Goiás, na época usada como rodovia Belém-Brasília (hoje BR-153), Avenida Pará; Rua 13, conhecida como Rua da Mata; Rua 02, na época conhecida como Rua Dueré. Ele cita que boa parte das ruas e Avenidas eram precárias cortadas à machado.
“Depois comecei a trabalhar na casa do velho Cesar Costa, pai do professor Celsinho na Rua Dueré (Rua 02 hoje), entre as Avenidas Pará e Mato Grosso. Era uma casinha de adobe e ali trabalhei por dois anos. Trabalhava lá e vendia os calçados na Avenida Goiás, onde montei uma loja”, disse.
No dia 05 de julho de 1962, Sr. Jonas casou com dona Antônia Barbosa Rocha, 75 anos, e tiveram quatro filhos. Ele lembrar que Dona Antônio é natural de Babaçulândia e chegou em Gurupi no ano de 1957.
“Cheguei aqui solteiro e nem pensava em casar porque era novo com 23 anos, mais um ano depois eu me casei. Depois começou a nascer os primeiros filho, esqueci de sair daqui e hoje não penso mais em mudar, só se for para o cemitério, para isso nossas gavetas estão prontas. Vivi aqui vida toda e continuarei depois de morto” diz.
No início da década de 1960 as escolas em Gurupi eram precária e apenas os jovens de famílias ricas tinham condições de deixar a cidade para estudar o ensino médio e faculdade em outras regiões.
“Naquele tempo não tinha nada e o único colégio era o grupo Bernardo Sayão, continuei aqui e esqueci que podia ter estudado e quando veio para cá o Ginásio do Colégio Estadual, que começou onde era a Escola Ruy Barbosa eu fiz exame de admissão, que era igual um vestibular, passei e conclui o ginásio que naquele tempo era até a quarta série ginasial – hoje não sei nem o que é porque mudou tudo”, relata.
Política
Sr. Jonas, conviveu com várias fases da política brasileira em Gurupi, desde João Goulat (PTB), governo militar de Castelo Branco (Arena) até redemocratização do pais, chegando ao atual governo de Michel Temer (PMDB). Em Gurupi acompanha as gestões municipais deste Francisco Henrique Santana, conhecido como Chiquinho Santana.
“Pouco tempo depois que cheguei aqui começou a Ditadura e as coisas mudaram tudo. Eu nunca sofri retração no tempo da ditadura e achava bom porque pelo menos você podia dormir em qualquer lugar e não tinha medo de ninguém. Não tinha bandido e se tinha a gente não tinha conhecimento porque eles desapareciam”, disse sorrindo.
Um dos acontecimentos que mais marcou a violência na política de Gurupi foi a morte do prefeito Francisco Henrique de Santana. Segundo Sr. Jonas no dia do homicídio ele estava numa região próximo a Porto Nacional indo para Romaria do Bomfim vender calçados que ele fabricava em Gurupi de forma artesanal.
“No dia 08 de agosto de 1963 mataram o prefeito Francisco Santana. Eu tinha um rádio portátil da Radio Semp Toshiba que estava em cima da cerca e durante aquela noite o caminhão quebrou, ficou sem luz e ficamos obrigados a dormir lá. Daí eu liguei o rádio e deu na Rádio Brasil Central, de Goiânia (GO) que tinham matado o prefeito de Gurupi. Daí eu falei para o Baé, que chamavam ele de bate pau do Chiquinho que tinha a chave o pau de arara para nos levar, não tinha como retornar e no outro dia cedo chegamos no Bomfim”, disse.
PDS e PMDB
Durante a redemocratização do País, apesar das ideologias do filiados na Aliança Renovadora Nacional (ARENA), que passou a ser PDS e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), hoje PMDB, Sr. Jonas, lembra que apesar de ser ligado ao PDS sempre teve respeito pela figura do ex-prefeito Jacinto Nunes.
Para mim o Jacinto Nunes da Silva foi o melhor prefeito de Gurupi, apesar de eu ter votado contra ele, porque naquele tempo eu fazia parte do PDS, e ele era do PMDB. Ele foi três vezes candidato, mas o Jacinto era uma pessoa muito simples e boa. Lembro que um dia ele chegou no Posto e me disse:
– Jonas agora você mudar e vai mudar e votar em mim, não vai?
E eu disse:
– Eu sou teu amigo e tudo, mas não voto em você porque eu sou de outro partido. Como é que eu posso votar em você? Mas somos amigos do mesmo jeito.
“Naquela época o velho Alcides sogro do Enéas, que era muito ignorante e toda vida foi um Peemedebista roxo, pois chegou a ser candidato a prefeito, quando eu trabalhava com o Enéas do Posto, ele chegou a dizer que ele fosse o Enéias eu não trabalharia mais no posto. Respondi a ele que trabalhava no Posto porque gostava demais do Enéias que o tenho até hoje como um irmão”, lembra.
Escuridão
Outra parte da história de Gurupi lembrada pelo pioneiro é da época em que apenas parte da cidade tinha energia elétrica, via gerador.
“A energia chegou aqui quando o governador era o Ary Ribeiro Valadão quando ainda fazia parte do norte goiano. Antes tinha um motor com gerador que trabalhava até as 22h e quando aproximava de desligar o motor começava a piscar as luzes e tínhamos que correr para casa porque desligava tudo. Energia só tinha nas principais ruas do Centro”, lembra Sr. Jonas.
Saúde
A decadência de estrutura da saúde da antiga Gurupi, quando fazia parte do antigo norte de Goiás também foi lembrada.
“Tinha o doutor José que era surdo tinha uma hospitalzinho na rua 01 perto do Bernardo Sayão entre as Avenidas Maranhão e Piauí, depois chegou o Dr. Gilberto que fazia consulta na escola Bernardo Sayão. Com o passar dos anos fizeram uma sociedade e construíram o Hospital Delfino Aguiar, depois vieram os doutores Divino, Colemar e Danilo. Também veio o Dr. Jeová, filho da dona Aninha”, resumiu.
Comunicação
Outro serviço público precário da época era a comunicação, pois não tinha telegrafo e nem telefone fixo.
“No ano de 1963 o meu pai morreu em Porto Franco (MA), época que o Jonair Rocha nasceu, e eu fiquei sabendo que ele tinha morrido cinco dias depois por meio de um telegrama que passaram para ao meu cunhado em Porto Nacional e depois é que chegou a Gurupi. Recebi a notícia cinco dias depois que o meu pai foi enterrado. Enquanto hoje, quando uma pessoa adoeça ou estoura uma unha na mesma hora o filho, o pai e a família toda ficam sabendo”.
Mudanças sociais
Enquanto a atual sociedade vive uma paranoia e o capitalismo consumista parasitário com valores em constantes mudanças, poucos jovens da modernidade conseguem imaginar a voltar ao tempo para entender a história de seus antepassados, não muito distantes.
“Eu acho que os jovens de hoje não sofreram igual eu o seu pai (Pedro Cruz) que para criar os filhos trabalhou demais na roça. Este povo de hoje acha que as coisas estão difíceis, se eles tivessem alcançado aquele tempo nosso com a dificuldade que tínhamos em que o arroz era pisado no pilão, não tinha uma geladeira, a luz era uma lamparina… Lembro quando fui criado no sertão do Maranhão nos anos 40, naquele tempo não tinha lamparina de querosene, mas de azeite de mamona no pavio. Hoje eu vejo nego (pessoas) reclamar quando passa cinco minutos sem energias, sendo que hoje tem ar condicionado, tem internet e telefone”, compara.
No final, o pioneiro avaliou que história trouxe avanços na tecnologia e valorizou o exercer da democracia.
“As coisas mudaram muito. A cidade cresceu e modernizou tudo, mas naquela época o povo era mais confiável, ou será que gente por ser desconhecedor das coisas acreditava mais porque naquele tempo não podia dizer que o prefeito era ladrão ou qualquer outra coisa que ninguém podia falar”.