“A insegurança que tanto assusta o ser humano tem sido ampliada com a lógica perversa do capital que tomou conta da sociedade industrial. O casamento, o trabalho, o sexo e o lazer, entre outras coisas, passaram a ser vistos a partir do prisma do vale tudo para se dá bem”.João Nunes
João Nunes da Silva
Doutor em comunicação e cultura contemporâneas, Mestre em Sociologia e professor da UFT Campus de Arraias. Trabalha como projeto em cinema e educação
Há poucos dias o sociólogo Bauman, de 91 anos nos deixou. Ele também deixou um grande legado com seus escritos sobre a vida na sociedade atual.
A principal idéia desse sociólogo polonês diz respeito á liquidez. Ele usou o conceito de liquidez para tratar das diversas situações, problemas e questões da atualidade que tem se tornado freqüente em nosso mundo.
A liquidez é uma ótima idéia para refletir sobre como somos fadados a viver num mundo no qual tudo se desfaz com facilidade impressionante. O sociólogo da liquidez nos mostra que na verdade não temos controle de nada, nem mesmo de nossas vidas e das nossas ações perante os contextos nos quais estamos inseridos.
![Bauman As lições de Bauman e a vida liquida Bauman As lições de Bauman e a vida liquida](http://www.atitudeto.com.br/wp-content/uploads/2017/01/Bauman.jpg)
Hoje vivemos e fazemos de tudo para ter pelo menos o mínimo de controle das nossas vidas; isso para que não nos tornemos marionetes de tudo e de todos.
Em tempos de liquidez as relações sociais, e também as afetivas, acontecem sob o prisma do medo e da insegurança.
O medo nos faz reféns de nós mesmos e provoca transtornos em nossas vidas quando olhamos para um lado ou para outro e não nos sentimos suficientemente seguros para assumir compromissos duradouros e sérios, principalmente no que diz respeito à vida a dois.
Procuramos em cada um de nós algo para se sentir seguros e aí nos damos conta que não somos suficientemente maduros e capazes de tomar atitudes que não nos machuquem tanto e que não machuquemos os outros que por alguma razão está no caminho conosco.
Bauman nos dá a entender que é melhor ter a certeza da insegurança e da fugacidade do que nos agarrar a algo que inexoravelmente não nos oferece segurança suficiente.
Mas o que fazer num mundo pautado no dinheiro, no lucro e no poder pelo poder? O que fazer num mundo no qual as instituições sociais, que foram criadas para favorecer pelo menos a sensação de segurança, já não se mostram suficientes para atender as demandas vigentes?
O que fazer numa sociedade cujo Estado, que, a rigor surgiu como uma forma de contrato para trazer a segurança, tem se tornado cada vez mais principal algoz dos humanos?
Mas aí é que está, tanto o Estado como as demais instituições na sociedade até agora não se mostraram suficientes para garantir a paz, a liberdade e a segurança dos indivíduos.
![João-Nunes-1a As lições de Bauman e a vida liquida João-Nunes-1a As lições de Bauman e a vida liquida](http://www.atitudeto.com.br/wp-content/uploads/2017/01/João-Nunes-1a.jpg)
Tudo se desfaz numa rapidez espetacular como se nada que existisse fosse para durar mesmo. Mas essa é a idéia mesmo, pois, as coisas não permanecem por toda a vida, uma vez que é por meio das transformações que o sentido da vida se faz presente; a questão é como se manter bem como humano nesse mundo. Quem afinal é equilibrado nesse mundo?
O grande problema quando passamos a ver tudo sob o prisma da liquidez é que não nos damos conta do que precisamos para viver bem, em paz e harmonia. E assim sequer nos encontramos como humanos, pois tudo se coisifica.
Quando tudo passa a ser pautado pela lógica do individualismo solapado pela ganância do dinheiro e do poder, evidentemente que todos passam a ser vistos e tratados como coisas descartáveis. E até mesmo quem defende esse tipo de sistema é vitima dele e não percebe.
Se as pessoas com quem convivemos são apenas vistas como objetos para atender nosso egoísmo, nosso desejo de poder, nossos anseios e ilusões, como podemos ter uma sociedade saudável onde todos passam a ser coisificados?
Nas relações afetivas, por exemplo, não interessa a quantidade de parceiros ou de pessoas com quem nos relacionamos numa noite, ou num momento fugaz, se o vazio é a certeza do que vem depois.
A insegurança que tanto assusta o ser humano tem sido ampliada com a lógica perversa do capital que tomou conta da sociedade industrial. O casamento, o trabalho, o sexo e o lazer, entre outras coisas, passaram a ser vistos a partir do prisma do vale tudo para se dá bem.
As lições de Bauman servem para nos manter alertas quanto ao tipo de mundo que nós mesmos construímos; ou melhor, na armadilha que construímos como humanos para nós mesmos.
Nesse tipo de sociedade o que se mostra mais seguro é saber que tudo se transforma numa rapidez impressionante. Mas há que se pensar no que cada um deve se apegar para não se perder no turbilhão das ilusões.