João Nunes da Silva
Doutor em comunicação e cultura contemporâneas, Mestre em Sociologia e professor da UFT Campus de Arraias. Trabalha com projetos em cinema e educação.
Ao retomar a leitura de algumas obras sobre o antigo norte goiano, hoje Tocantins, me deparo com um texto da conterrânea historiadora Juciene Ricarte Apolinário intitulado Vivências escravistas no Norte de Goiás no século XVIII. Esse texto está na coletânea organizada pelo professor Dr. Odair Giraldin, A (trans)formação do Tocantins., Goiânia: UFG, 2002.
Trata-se de um texto fundamental para entender um pouco da história do Tocantins, principalmente para desconstruir o discurso instituído pelos colonizadores responsáveis pelo genocídio de povos indígenas, pela escravidão nessas terras e pela dominação ainda vigente.
Para maiores conhecimentos recomendo também o livro Os Akroá e outros povos indígenas nas fronteiras do sertão – Políticas indígena e indigenista no norte da Capitania de Goiás, atual estado do Tocantins, século XVIII. Goiania: Kelpes, 2002.
Juciene Apolinário também escreveu outra obra sobre o antigo norte goiano, mais precisamente A escravidão negra no Tocantins colonial, livro publicado em 2000. Os estudos da autora sobre a situação dos indígenas e dos escravos no período colonial remontam ao período aurífero que motivou a vinda de aventureiros desbravadores ao norte do estado os quais deixaram profundas marcas, principalmente relacionadas a escravidão, a espoliação e a ambição. As pesquisas realizadas pela autora, em documentos no Brasil e em Portugal, destacam registros do período colonial em Arraias e seu entorno.
As duas obras citadas fundamentam os trabalhos do professor Wolfgang Teske, que publicou seus Estudos sobre a cultura quilombola na Lagoa da Pedra – Arraias- Tocantins, cuja obra foi publicada pela editora do Senado Federal em 2011. Do mesmo autor também foi publicado A roda de São Gonçalo na comunidade quilombola da Lagoa da Pedra em Arraias-TO.
Outra obra não menos importante e indispensável para conhecer mais de perto o município de Arraias e as relações de poder é a tese de doutorado da professora Magda Suely Pereira Costa, intitulada Poder local em Tocantins – domínio e legitimidade em Arraias.
A autora, que também é natural de Arraias, faz uma importante leitura sobre a forma como o poder local é mantido ainda pelos fazendeiros e políticos de famílias tradicionais os quais encontram sua legitimidade por meio de recursos de diferentes ordens sociais tais como: religiosa, patriarcal, a reciprocidade, político-partidária e governamental tão presentes no município até o momento. A autora ancora seus estudo nos conceitos e ideias de Max Weber, especialmente no que tange as formas legitimas de dominação, a saber: racional legal e tradicional.
Para maior entendimento da historia de luta e de resistência do povo negro, população predominante em Arraias – Tocantins é fundamental a leitura da dissertação de mestrado de Silvia Adriane Tavares de Moura intitulada Nas palmas da capoeira: resistência cultural pela chapada dos negros em arraias/to (1984 a 2012).
A autora faz um importante histórico do grupo de capoeira situado em Arraias e liderado pelo Mestre Fumaça. Trata da criação da Associação Cultural Chapada dos Negros, conta a historia da antiga cidade, que hoje está em ruínas e da luta pela preservação da Chapada dos Negros para que se torne Patrimônio histórico. Por fim, a dissertação destaca a capoeira como principal elemento de resistência do povo negro, além de ser um patrimônio cultural da nossa história, arte, dança, luta e filosofia.
As obras citadas apresentam em seu conjunto um importante arsenal histórico e sociológico para compreender o Tocantins, sua formação, desenvolvimento, suas contradições e lutas do seu povo; por sua vez, oferece oportunidade para a análise crítica sobre as formas de dominação e suas legitimações ainda predominantes nos dias atuais, mas não deixa de demonstrar a capacidade de luta e de resistência do povo tocantinense, em especial dos povos quilombolas, dos indígenas, dos movimentos sociais e das organizações da sociedade civil no sentido de construção da cidadania coletiva.
Por fim, as obras apresentadas demonstram a importância da Universidade quando estudantes e professores se colocam a disposição de uma produção intelectual comprometida com a sociedade mais ampla de forma que seja capaz de atender as suas demandas. É dessa forma que a academia faz sentido, especialmente ao encontrar formas de tornar conhecida a verdadeira história de nossa gente marcada por conflitos e por contradições e por resistência as diversas formas de exploração que se fizeram presentes em todos os recantos do nosso país.