O defensor público José Alves Maciel, conhecido como Kita Maciel, mostra orgulhoso um recorte de jornal, datado de 11 de dezembro de 1995, que traz a notícia sobre sua primeira atuação em um Tribunal do Júri.
Dezenove anos se passaram, vários processos chegaram e tiveram resultados, muitos positivos, todos embasados na defesa e garantia dos direitos dos assistidos.
No dia 19 de dezembro de 2013, o Defensor Público atuou em seu centésimo júri, realizado no município de Miranorte. Para Kita Maciel, o trabalho como Defensor Público exige primeiramente vocação e a identificação com o outro, neste caso, com as pessoas mais necessitadas e que precisam de ajuda. “Sempre tive uma vontade muito grande de trabalhar em prol das pessoas mais necessitadas, entre elas, aquelas pessoas que não tem condições de prover a despesa com o custo de um processo judicial. Para ser Defensor Público é preciso ter a consciência de se solidarizar com o problema do outro, principalmente das pessoas mais carentes, desprovidas de recursos, como é o caso dos nossos assistidos. Eles são a razão para que a Defensoria Pública exista”, disse.
Aos 53 anos – dos quais 23 deles dedicados à Defensoria Pública – Kita Maciel ingressou nesta atividade no ano de 1991, como contratado e posteriormente aprovado no primeiro concurso público da Instituição, realizado em 2004, e já esteve em todas as áreas de atuação da Defensoria Pública. Foram seis anos consecutivos, atuando exclusivamente em Tribunais do Júri da Comarca de Gurupi. Depois atuou nas varas Criminal, Cível; foi diretor do Núcleo Regional de Gurupi e atualmente Kita Maciel é responsável pela Vara de Execuções Penais da Defensoria Pública da mesma Regional.
Apaixonado pela profissão, Kita Maciel destaca que a carreira de Defensor Público despertou outra paixão, a docência. Maciel é professor do Curso de Direito do Centro Universitário Unirg, onde leciona desde 1997, como professor concursado. “Procuro levar para as minhas aulas além das teorias também as vivências diárias no âmbito da Defensoria Pública. São experiências que vão ajudar os alunos no exercício da profissão, são vivências que valem muito”.
Kita Maciel possui um arquivo onde estão catalogados todos os Tribunais em que atuou, constando data, local e resultados. Dos 100 Júris em que atuou pode-se considerar que em 69 os resultados foram positivos: 22 absolvições, 32 desclassificações de crimes, 15 resultados favoráveis, ou seja, retirada de qualificadoras e/ou concessão de privilégios, resultados que garantem a redução da pena. Para Maciel, o principal desafio é sempre buscar resultados favoráveis aos assistidos, garantindo a plenitude da defesa.
“O defensor público e o advogado particular não podem fazer a defesa de faz de conta, mesmo que no íntimo o desejo é que o réu seja condenado porque efetivamente cometeu um ilícito penal, ele deve fazer aquela defesa em busca de um bom resultado. Nas minhas 100 atuações em Tribunas do Júri Popular, eu jamais fiz uma defesa de faz de conta, mesmo que no meu íntimo eu queria uma condenação. No entanto, eu estava ali como defensor público e jamais poderia pedir uma condenação. A Constituição Federal garante a defesa plena e o júri tem como um dos pilares básicos a plenitude da defesa. O profissional jamais pode chegar em plenário e pedir a condenação de quem quer que seja. Ele pode, por exemplo, não pedir a absolvição, mas buscar um resultado favorável ao assistido, uma redução de pena, até porque esse papel de condenar e absolver é dos jurados.”
De acordo com o defensor público, a atuação em tribunais exige habilidades especiais para lidar com o conflito social que envolve crimes julgados em tribunais do júri uma vez que julga crimes dolosos contra a vida e costumam ter grande comoção social.
“Enquanto Defensor Público nós temos um compromisso e isso é um dever constitucional, que é assegurar o acesso à justiça, integral e gratuito a quem não tem condições de arcar com esse custo. O defensor na tribuna do júri tem que ter muita habilidade pra saber lidar com esses dois lados. O lado da vítima e do acusado e também da família. E ainda com o lado da sociedade, é preciso saber explicar ao povo que o defensor está ali exercendo seu papel constitucional”.
Dos Júris em que atuou, Kita destaca que os mais marcantes foram de casos em que irmãos tiraram a vida de irmãos, uma vez que a família da vítima e do réu é a mesma, por exemplo. “Fiz um júri no município de Peixe, de um irmão que tirou a vida de outro. Durante todo o julgamento em plenário o réu chorava compulsivamente, sem parar, e toda a família chorava junto com o réu. Essa situação comoveu a todos que estavam presentes ali.
Kita Maciel relembrou a primeira vez em que usou beca e atuou no Tribunal do Júri. “Cada júri é uma história nova, é uma adrenalina diferente, eu me lembro quando eu fiz meu primeiro júri em 1995, acompanhado de outros defensores, eu tremi bastante e acho que demorei mais ou menos uns 10 minutos para me controlar dada a ansiedade e a responsabilidade de estar ali defendendo e lutando pela liberdade de alguém, e essa pessoa cometeu um ilícito penal” .
Para Kita, o julgamento é algo que exige muita seriedade e responsabilidade, respeitando os fatos e contextos, para que erros não sejam cometidos e pessoas inocentes não sejam injustamente privadas de sua liberdade. “Quero ressaltar que muitas vezes uma pessoa que comete um ilícito penal, por exemplo, pode ter sido provocada, ela pode não ser a verdadeira culpada, a vítima pode contribuir muito para esses eventos criminosos como é o caso dos crimes de homicídio”
Tribunal do Júri
O Tribunal do Júri julga crimes dolosos contra a vida, sendo homicídio; infanticídio (mãe mata o filho após o parto); induzimento, instigação ou auxílio a suicídio e aborto. O Tribunal do Júri é formado por 25 jurados, mas a decisão é dada pelo Conselho de Sentença, formado por sete jurados.