“É importante sempre lembrar que democracia não se resume ao direito de votar, até mesmo porque quando o eleito não corresponde aos interesses dos grandes grupos econômicos, em geral tem havido a tentativa de derrubada do governante que se mostra mais voltado para os anseios populares, como tem demonstrados os golpes e as ditaduras” João Nunes.
João Nunes da Silva
Doutor em comunicação e cultura contemporâneas, Mestre em Sociologia e professor da UFT Campus de Arraias. Trabalha como projeto em cinema e educação
A política faz parte da vida de qualquer ser humano; como afirmou o filosofo grego Aristóteles, o ser humano é um a animal político; na verdade o filósofo nos lembra da importância da política como fundamental para a vida em sociedade.
Embora Aristóteles reconheça a importância da política, esse filósofo admitia a cidadania para poucos, uma vez que com a predominância da maioria da sociedade formada por escravos, camponeses, mulheres e estrangeiros, esses não tinham direito algum; isto é, a cidadania já era vista como algo para poucos; ainda hoje prevalece esse pensamento.
Com a Revolução francesa, que alçou ao poder os liberais burgueses, a idéia de cidadania foi ampliada, de certa forma; digo de certa forma porque surgiu a possibilidade de maior participação da maioria sociedade; todavia, na prática não houve de fato essa participação; até mesmo porque a chamada democracia indireta, que permite a escolha dos representantes do povo para o parlamento, na verdade tem sido usada para a garantia dos interesses de poucos; um exemplo claro disso é que o voto universal é algo muito recente; as restrições ao voto da mulher, no Brasil, por exemplo, só foram suprimidos a partir de 1932, no governo de Getúlio Vargas.
É importante sempre lembrar que democracia não se resume ao direito de votar, até mesmo porque quando o eleito não corresponde aos interesses dos grandes grupos econômicos, em geral tem havido a tentativa de derrubada do governante que se mostra mais voltado para os anseios populares, como tem demonstrados os golpes e as ditaduras.
A chamada política institucional corresponde àquela voltada para a existência dos governos, dos parlamentos e dos Estados. Mas a política, nesse sentido, pertence ao plano macro; no plano micro a política faz parte do cotidiano; tudo que está fora das instituições, mas que corresponde aos embates, onde se mostram os interesses diversos; até numa relação a dois existe política.
Quando existe consenso, pelo menos entre duas pessoas, de alguma forma a política aí está presente; quando acontece o contrário, significa que a política se mostra mais acirrada ainda, pois cada um tem seus interesses e não está disposto a ceder. De toda forma, como se vê, há política.
Na concepção estreita e elitista de política se mostra uma prática inescrupulosa e corrosiva de que política é coisa de poucos e para poucos. Nessa concepção até mesmo o senso comum pensa a política como algo nefasto e corruptível, de modo que somente os “escolhidos” possuem a capacidade de fazer parte da política e, portanto de fazer política.
É também com esse pensamento de política para poucos que alguns candidatos fazem política com o discurso de que não são políticos, mas empresários, isso ou aquilo; é uma tentativa de desqualificar a política e afastar a maioria fazendo política como se fosse dotado de algo puro, desprovido da política: o nome correto dessa postura se chama fascismo.
Essa concepção mostrada anteriormente se mostra claramente quando numa empresa, por exemplo, alguns trabalhadores questionam o sistema, as condições de trabalho, os baixos salários, ou coisa similar que de algum modo evidenciem a insatisfação vivida pelos trabalhadores, e logo são ignorados, isolados ou perseguidos, taxados como fazedores de política.
Logo se vê, no caso, que há uma forma de representação ou imaginário criado pelas elites de que política é coisa apenas para poucos; isto é, só pode ser feita por aqueles que pertencem à elite. Esse imaginário é forçosamente enaltecido pela grande mídia como forma de desqualificar e de criminalizar os militantes e movimentos sociais defensores da igualdade e da justiça social.
As elites não toleram jamais o crescimento do pensamento consciente das populações empobrecidas; ou seja, a Casa Grande treme quando a senzala se organiza; por isso a perseguição, a tentativa de desqualificação e até mesmo o uso da força para reprimir os movimentos sociais.
O temor das elites está no voto consciente e na organização dos dominados; para impedir que isso ocorra a melhor forma encontrada pelos detentores do poder está em manter a maioria na ignorância; daí a necessidade de uma educação apenas para o trabalho; isto é, que forme máquinas e não seres pensantes. Daí o surgimento da idéia de uma escola “sem partido”, na qual apenas um lado se impõe enquanto o outro deve obedecer.
A rigor, a educação formal tem sido criada para a reprodução do sistema criado pelas elites e para a naturalização do pensamento único. Isto significa que não se permite pensar fora da fôrma. A escola, com raras exceções, tem sido o lugar dessa formatação única.
Aqueles que defendem a Escola Sem Partido defendem sim a escola acrítica, voltada unicamente para a formatação; significa ainda a prevalência de uma única ideologia (concepção de mundo) de forma impositiva. Tal escola está longe de ser uma escola para a vida; mas sim é uma forma de fazer política para a manutenção de uma ordem que interessa apenas para quem está no topo.
Na contramão desse pensamento único está a política, pois a vida em si é o embate continuo dos humanos para garantir a segurança e o bem estar; todo ser humano é social e político, daí a necessidade do confronto no campo da vida; nisso se resume a política.
A política é o lugar da luta pela liberdade para todos, por isso onde há vida há política e, por sua vez, não existe educação apolítica.