As novas contradições do governo no discurso de insistir com a privatização das estatais federais às vésperas das eleições — inclusive daquelas mais bem classificadas pelo próprio Executivo, a exemplo da Caixa Econômica Federal — provocaram a reação dos empregados do banco público. A Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae) analisou, com indignação, as recentes declarações do ministro Paulo Guedes [Economia] na defesa de criação de um “fundo de erradicação da pobreza” como tentativa de argumento para a venda não só da Caixa Econômica como também da Petrobras, Eletrobras e do BNDES. Estas empresas estão entre as instituições com as melhores avaliações na 5ª certificação do Indicador de Governança IG-SEST, que avaliou 60 estatais.
No contexto da divulgação dos resultados do Indicador, na última semana, Guedes chegou a admitir que o governo seguirá o caminho das privatizações porque o abandono dessa agenda pode representar perda de apoio do eleitorado de Bolsonaro. “Venda alguns ativos aqui e enche o tanque do fundo. Nosso desafio é gerir bem as estatais, mas encaminhando para o mercado”, afirmou o ministro. Conforme analisa o presidente da Fenae, Sergio Takemoto, as falas de Paulo Guedes confirmam que as ações do governo têm uma meta, uma direção: a eleição presidencial de 2022.
“A única preocupação é reelegerem o atual presidente, não se importando com as reais demandas da sociedade nem se as medidas tomadas terminarão de destruir o país”, destaca Takemoto. “Como pode um ministro falar em venda do patrimônio da nação para encher um ‘tanque’ que, na realidade, é o tanque do mercado financeiro?”, questiona o dirigente.
Ao defender recentemente a privatização de todos os aeroportos do país, Guedes reafirmou que o governo está atuando para que as estatais também sejam privatizadas: “Elas estão sendo preparadas, modernizadas, transformadas do ponto de vista de governança para não haver de novo Petrolão, Mensalão, ‘Caixão’, porque a Caixa também estava nisso”.
O presidente do banco, Pedro Guimarães, ressaltou — também na ocasião do anúncio da 5ª certificação do IG-SEST — que a empresa “nunca teve tanto lucro, nunca emprestou tanto”. No terceiro trimestre, a Caixa Econômica aferiu lucro líquido de R$ 3,2 bilhões, representando um aumento de 69,7% em relação ao mesmo período do ano passado. No acumulado do ano [até setembro], o lucro do banco alcançou R$ 14,1 bilhões.
“É esta empresa pública, com estes resultados e que provou ser essencial para o país especialmente na pandemia, que o governo quer vender. Junto com a privatização de outras estatais necessárias ao Brasil, a real intenção é maquiar o orçamento, passando à sociedade a falsa mensagem de recuperação econômica no cenário eleitoral”, alerta Sergio Takemoto.
“O governo não tem políticas públicas sustentáveis nem saídas viáveis para o país”, emenda o presidente da Fenae, ao pontuar o recuo do PIB [Produto Interno Bruto] pelo segundo trimestre consecutivo e a economia de volta ao caminho da recessão. “Ao invés de focar em medidas de reaquecimento da produção e do emprego, o que o governo faz é tentar queimar o patrimônio dos brasileiros. E quando o dinheiro das privatizações acabar, o que será feito do Brasil vendido ao mercado?”, acrescenta.
DANOS À POPULAÇÃO — Takemoto também observa que a abertura de capital da Caixa Seguridade, no início deste ano, acendeu a luz amarela sobre como a venda de subsidiárias do banco comprometerá o desempenho da instituição, colocando em risco os programas sociais históricos operacionalizados pela Caixa. Exemplo disso são o Bolsa Família, já extinto pelo atual governo; e o Minha Casa Minha Vida, substituído pelo Casa Verde e Amarela, que desassistiu a população mais carente ao acabar com o subsídio para acesso à moradia.
“O mesmo risco correm a Caixa DTVM, que foi criada já com a promessa de abertura ao mercado, e também a Caixa Cartões, as Loterias Federais e o ainda nem oficialmente criado Banco Digital. São as próximas subsidiárias estratégicas da Caixa Econômica na meta privatista de Pedro Guimarães e Bolsonaro”, afirma Sergio Takemoto.
A representante dos empregados no Conselho de Administração da Caixa, Rita Serrano, observa que o Brasil caminha na contramão do mundo, conforme apontam diferentes indicadores. “Seja na volta da miséria, na destruição de políticas e programas sociais ou na privatização das estatais”, pontua.
Ao observar que o Reino Unido fundou um banco público de desenvolvimento no contexto da pandemia e que a Alemanha utiliza estrutura pública equivalente para fazer investimentos e superar a crise, Serrano aponta: “Enquanto isso, no Brasil, o governo quer privatizar tudo aquilo que for possível, piorando a qualidade de vida da população, que ficará sem os serviços executados pelas empresas públicas. A realidade já nos mostra isso: aumentos sucessivos dos preços da gasolina, do gás, da luz elétrica. Tudo isso tem a ver com essa política de privatização. E acabar com a Caixa significa perder a principal gerenciadora de políticas públicas e operadora de investimentos no país”.